Refugiados e brasileiros afinam projetos de Negócios Sociais em São Paulo (Acnur, 27/10/2016)
Participantes da terceira rodada de workshop apoiado pelo ACNUR desenvolvem projetos com o objetivo de promover a integração dos estrangeiros que chegam ao Brasil para recomeçarem suas vidas.
Em uma terceira rodada de debates realizada em São Paulo no último sábado, cerca de 30 pessoas, entre elas refugiados, imigrantes e brasileiros, conseguiram afinar seus projetos de negócios voltados a solucionar problemas de estrangeiros que desembarcam no Brasil para reconstruir suas vidas.
Os seis grupos vão apresentar seus projetos, já no formato de negócio inovador, a um corpo de jurados nos próximos dias 19 e 20 de novembro, na rodada final do projeto Negócios Sociais. O vencedor receberá uma consultoria do Sebrae para o projeto se tornar realidade.
A série de workshops Negócios Sociais é uma iniciativa da organização não-governamental Migraflix e tem o apoio do ACNUR, do Google e do Sebrae. Além de ensinar novas ferramentas para a montagem de um empreendimento, os workshops têm os objetivos de integrar brasileiros, refugiados e imigrantes e desafiá-los a, juntos, propor ideias criativas e economicamente plausíveis para facilitar a vida de quem quer viver no Brasil.
Os seis projetos vêm sendo trabalhados e aperfeiçoados desde o primeiro workshop, em 13 de agosto: uma plataforma na internet para facilitar a busca de emprego; a montagem e distribuição de kits de boas-vindas em aeroportos; a recepção de refugiados em portos, aeroportos e pontos de fronteira; uma plataforma online para empresas recrutarem refugiados e imigrantes; outra para o compartilhamento de experiências, produtos e serviços entre refugiados imigrantes e brasileiros; e um banco de dados com oportunidades de hospedagem e moradia.
No último sábado os grupos foram expostos ao MVP, uma ferramenta para o empreendedor aprender sobre seus clientes potenciais no prazo mais rápido possível. Refugiados e imigrantes rodaram pelos outros grupos para identificar falhas e boas ideias nos projetos e contribuir para que fossem aperfeiçoados. Tutores convidados pelo Migraflix examinaram cada uma das propostas e apontaram acertos e erros. Nas rodadas anteriores, os participantes haviam aprendido usar outras duas ferramentas, o Design Business e o Canvas. Os workshops foram conduzidos pelos consultores Julian Condamines, especialista em Design Thinking, e Gustavo Faria, da agência de comunicação Aeroplan.
Uma das mais entusiasmadas participantes do Negócios Sociais é a administradora de empresas Maha Jean Mamo, que nasceu na Síria e passou a maior parte de sua vida no Líbano, com sua família. Maha jamais conseguiu ser reconhecida como cidadã desses dois países por razões religiosas e, refugiada no Brasil há dois anos, tornou-se uma das vozes mais vibrantes da causa da apatridia no mundo. Por sua influência, seu grupo no Negócios Sociais trata de uma das questões que mais a afligiu quando decidiu refugiar-se no Brasil: a moradia.
“Recebi ordem de deixar o Líbano em 48 horas e, assim que consegui o visto para o Brasil, a única coisa que queria saber era onde eu iria dormir”, relatou. “Felizmente, antes de eu embarcar junto com meus irmãos, encontrei pelo Facebook uma família brasileira que aceitou nos hospedar, em Belo Horizonte”, completou Maha.
Já o grupo do engenheiro de telecomunicações Majd Soufan contribuiu para um dos projetos voltados para a recepção de refugiados nos pontos de chegada no Brasil. “Todos precisam de informações básicas, como onde se abrigar, como encontrar água e comida, como solicitar o refúgio às autoridades, como conseguir um emprego”. Soufan é refugiado sírio e vive no Brasil há três anos. “Tenho aprendido aqui como desenvolver uma ideia de impacto no Brasil, em benefício de brasileiros, refugiados e imigrantes”, acrescentou.
Na fase de busca de um emprego condizente à sua formação, o refugiado no Brasil tem enfrentado os mesmos problemas que os brasileiros desempregados. A crise econômica afeta a todos, sem distinção. Mas, dentre vários empecilhos, os estrangeiros se ressentem de processos mais rápidos e menos custosos de revalidação de seus diplomas. Muitos refugiados graduados em seus países de origem ou em outros lugares têm ainda dificuldade de conseguir a documentação necessária. Um dos grupos do Negócios Sociais fixou-se em como facilitar esse processo. Entre seus participantes está o refugiado cubano José Angel Malbranche, que há um ano vive no país.
José Angel atua na sua área de formação: é graduado em Língua Inglesa, em Cuba, e trabalha como professor e tradutor desde que ingressou no Brasil. Mas não trouxe seu diploma, o que lhe causa entraves para se candidatar a um mestrado e a um emprego em escolas. “Este workshop abriu a cabeça de todos nós e nos dá ferramentas para adotar projetos que vão ajudar muitas outras pessoas”, resumiu.
Ao avaliar o projeto de outro grupo, que pretende divulgar um folheto com informações básicas – e essenciais – para refugiados recém-chegados no Brasil, Alphonse Nyembo, da República Democrática do Congo, sugeriu a inclusão de um contato para auxílio psicológico imediato. “Os refugiados chegam muito abalados, têm medo do que vão encontrar no país que os acolhe. Quando uma pessoa é forçada a se deslocar devido à guerra, já está com problema psicológico”, comentou para todos, durante os trabalhos.
Por Denise Chrispim, de São Paulo.
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