Maratona de negócios sociais premia projetos que se propõem a solucionar os desafios de acolhimento de refugiados e migrantes em São Paulo (Acnur, 24/11/2016)

Oficina colaborativa de desenvolvimento de projetos apresentou iniciativas nas áreas de moradia, empregabilidade, troca de serviços e geração de laços entre “novos brasileiros” e a população local.

Após quatro meses de debates e diferentes oficinas de trabalho, a maratona de negócios Creatathon foi concluída no último sábado (19/11) com a escolha de projetos para facilitar a integração de refugiados, apátridas e migrantes estrangeiros no Brasil.

Promovido pelo Migraflix (plataforma social para a geração de renda e intercâmbio cultural entre a população local, migrantes e refugiados) e com o apoio do ACNUR – a Agência da ONU para Refugiados – o Creatathon Demo Day teve a apresentação de cinco projetos idealizados por 30 pessoas de 14 diferentes nacionalidades (entre elas refugiados e apátridas atendidos pelo ACNUR no Brasil). O evento aconteceu na sede do Google, em São Paulo, empresa que também apoia a iniciativa.

Grupo vencedor do Creatathon Demo Day posa para foto oficial após ter sido calorosamente aplaudido pelos demais participantes que propuseram diferentes projetos para solucionar problemas comuns de quem chega ao Brasil. Foto: ©ACNUR/M.Pachioni.
Grupo vencedor do Creatathon Demo Day posa para foto oficial após ter sido calorosamente aplaudido pelos demais participantes que propuseram diferentes projetos para solucionar problemas comuns de quem chega ao Brasil. Foto: ©ACNUR/M.Pachioni.

Com a participação de uma apátrida e de refugiados em sua concepção, o projeto “Home for Hope” foi eleito o grande vencedor do Creatathon Demo Day. O projeto é uma plataforma de moradia emergencial para estrangeiros recém-chegados ao país, sem laços sociais com os residentes locais e que se encontram em situação de vulnerabilidade.

Por ter sido eleito o vencedor, o projeto será contemplado com uma mentoria do Google Campus, além de uma consultoria em assessoria jurídica e contábil, apoio da empresa UHU para a construção da identidade visual e da agência de publicidade NoBullshit para sua estratégia de divulgação.

Assim como o “Home for Hope”, os projetos Xseed e Share and Care (respectivamente segundo e terceiro colocados na disputa) também receberão uma consultoria da Escola de Negócios do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) que, ao longo de sete encontros, promoverá a transformação dos projetos em negócios economicamente viáveis e de impacto social.

O Xseed é uma plataforma de busca ativa de emprego para refugiados de acordo com suas habilidades e conhecimentos já adquiridos, enquanto que o Share and Care é plataforma virtual de troca de serviços entre brasileiros e estrangeiros, propiciando ganhos comuns e contatos sociais.

Em comum, todos os projetos tiveram a participação direta de refugiados e migrantes no desenvolvimento das propostas que compuseram o Creatathon.

“Foi um longo processo de diálogo, entendimento, maturação de ideias e aprendizados que envolveu o conhecimento dos brasileiros com as experiências multiculturais dos estrangeiros. Os projetos são muito relevantes para solucionar alguns dos problemas mais comuns de quem chega ao Brasil”, diz Alphonse Nyembro, refugiado da República Democrática do Congo que vive no Brasil há quatro anos e que foi um dos participantes mais ativos do Creatathon.

Além de estruturar novas ferramentas para a montagem de um empreendimento social, os workshops também permitiram que brasileiros conhecessem de forma mais aprofundada a realidade e os dilemas das pessoas refugiadas e imigrantes. Para o fotógrafo José Roberto Comodo Filho, brasileiro e participante de um dos grupos do Creatathon, “esta foi uma das experiências mais intensas que eu vivenciei em toda minha vida, pois consegui me colocar na posição do outro e foi de fato uma sensação incrível, mas também angustiante pelas dificuldades e estereótipos que lhes são atribuídos”.

Para Isabela Mazão, chefe do escritório do ACNUR em São Paulo, “os brasileiros se inscreveram com a intenção inicial de ajudar os refugiados a pensarem estrategicamente, mas ao conversar com eles perceberam que a troca de ideias e de experiências profissionais não se daria de forma unidirecional”.

Como ficou evidente ao longo do processo, “as pessoas refugiadas têm talentos, conhecimentos e formação capacitada como qualquer outro grupo aleatório de pessoas, sendo necessário que o setor privado se atente a este fato e ofereça mais possibilidades de empregar refugiados notadamente qualificados, comprometidos e dedicados”.

Exemplo disso é a refugiada síria Dana Al Balkhy, de 28 anos. Ela é professora particular de idiomas, chegou sozinha ao Brasil há três anos e quer justamente aproveitar esta oportunidade dos encontros para evitar que os estrangeiros que estão chegando ao Brasil, em especial refugiados, passem pelas mesmas dificuldades que ela enfrentou quando aterrissou em Guarulhos com uma mala e apenas uma nota de um dólar no bolso.

“Os encontros que tivemos para discutir as ideias e aperfeiçoar os projetos foram planejados para fazer o bem a quem nem sequer conhecemos, mas sabemos que precisam dessa ajuda tão necessária nesse momento delicado, e que isso faz uma diferença imensa para quem chega ao novo país”, afirma a refugiada.

Diante do maior fluxo de deslocados forçados no mundo já registrado, o ACNUR tem apoiado iniciativas inovadoras que transformam os desafios de integração de refugiados em oportunidades de desenvolvimento pleno e sustentável, com contribuições dos próprios refugiados. Propostas do Migraflix refletem este contexto, pois têm como base workshops culturais ministrados por refugiados e imigrantes para os integrar social e economicamente por meio da divulgação da sua própria cultura.

A diretora da Unidade de Inovação do ACNUR global, Corinne Gray, esteve no Brasil e acompanhou uma das etapas do Creatathon, ressaltando a afinidade desta iniciativa com os trabalhos do ACNUR em sua área de inovação. “Acreditamos que o refugiado, o solicitante de refúgio e o imigrante são os especialistas sobre suas próprias condições de vida e têm de tomar parte da construção das soluções para seus problemas”, afirmou. “As soluções não estão dentro de nossa organização, mas na comunidade que se beneficiará delas”, concluiu.

Por Miguel Pachioni, de São Paulo

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