Estes 10 atletas refugiados competirão nos Jogos Olímpicos Rio 2016 (Acnur, 03/06/2016)

O Comitê Olímpico Internacional anunciou hoje a seleção de 10 refugiados que irão competir no Rio de Janeiro, formando a primeira Equipe Olímpica de Atletas Refugiados.

Os integrantes da equipe Olímpica de Atletas Refugiados que disputará os Jogos do Rio 2016. Os integrantes da equipe Olímpica de Atletas Refugiados que disputará os Jogos do Rio 2016 (Foto: Acnur)
Os integrantes da equipe Olímpica de Atletas Refugiados que disputará os Jogos do Rio 2016. Os integrantes da equipe Olímpica de Atletas Refugiados que disputará os Jogos do Rio 2016 (Foto: Acnur)

Pela primeira vez, uma equipe de atletas refugiados competirá pelo ouro olímpico.

Desde o início dos Jogos Olímpicos modernos, em 1896, mais de 200 equipes nacionais competiram pela glória nos Jogos de Verão e de Inverno. Agora, pela primeira vez, uma equipe composta por refugiados irá competir.

O Comitê Olímpico Internacional anunciou hoje a seleção de 10 refugiados que irão competir em agosto deste ano, no Rio de Janeiro, formando a primeira Equipe Olímpica de Atletas Refugiados. Eles incluem dois nadadores sírios, dois judocas provenientes da República Democrática do Congo, um maratonista da Etiópia e cinco corredores de meia-distância do Sudão do Sul.

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“A sua participação nos Jogos Olímpicos é uma homenagem à coragem e perseverança de todos os refugiados em superar a adversidade e construir um futuro melhor para si e suas famílias”, disse o Alto Comissário da ONU para os Refugiados, Filippo Grandi. “O ACNUR está com eles e com todos os refugiados”.

A iniciativa acontece em um momento em que cada vez mais pessoas – 59,5 milhões na última contagem – foram forçadas a fugir de suas casas para escapar de conflitos, violação dos direitos humanos e perseguição. Os atletas refugiados que os representarão no Rio esperam mostrar ao mundo suas capacidades de resiliência e seus talentos inexplorados.

Conheça o #TeamRefugees

@ ACNUR

Rami Anis, 25 anos, Síria, 100 metros borboleta.

Rami Anis começou a treinar oficialmente natação aos 14 anos idade, em Alepo. Ele diz que os méritos são de seu tio Majad, que participava de campeonatos de natação, na Síria, motivando sua paixão por competir nas águas. “A natação é a minha vida”, disse Ramis. “A piscina é o meu lar”.

Enquanto os bombardeios e sequestros aumentavam em Alepo, sua família o colocou em um voo para Istambul, para que ele fosse morar com seu irmão mais velho que estava estudando na Turquia. “A bolsa que eu carregava tinha duas jaquetas, duas camisetas, duas calças – era uma bolsa pequena”, lembrou Ramis. “Eu pensei que ficaria na Turquia por uns dois meses e depois voltaria ao meu país”.

“A piscina é o meu lar”.

Quando os meses se tornaram anos, ele começou a usar seu tempo para aprimorar sua técnica de natação no prestigiado Clube Esportivo de Galatasaray. No entanto, sem nacionalidade turca, ele não podia competir. “É como se alguém que está estudando, estudando, estudando e é impedido de fazer as provas”.

Determinado, Rami entrou um bote inflável para a ilha grega de Samos. Eventualmente, chegou à cidade belga de Ghent, onde tem treinado nove vezes por semana com a ex-nadadora olímpica Carine Verbauwen.

“Com a energia que eu tenho, estou seguro que posso alcançar os melhores resultados” disse. “Será uma grande emoção participar das Olimpíadas”.

Yolande Mabika, 28 anos, República Democrática do Congo, judô

Combates no leste da República Democrática do Congo separaram Yolande Mabika de seus pais quando ela era uma criança. Ela se lembra de poucas coisas além de correr sozinha e ser pega por um helicóptero que a levou para a capital, Kinshasa. Lá, vivendo em um centro para crianças deslocadas, ela descobriu o judô.

Yolande passou a competir em torneios importantes. “O judô nunca me deu dinheiro, mas me deu um coração forte”, diz ela. “Eu fui separada da minha família e costumava chorar muito. Comecei com o judô para ter uma melhor vida”.

“O judô nunca me deu dinheiro, mas me deu um coração forte”.

Em 2013, quando ela veio para o Rio para competir no Campeonato Mundial de Judô, seu treinador confiscou seu passaporte e limitou seu acesso à alimentos – como ele fazia habitualmente em todos as competições no exterior. Farta de anos de abuso, incluindo a ser enjaulada depois de não vencer torneios, Yolande fugiu do hotel e pelas ruas do Rio de Janeiro buscou ajuda.

Agora, como refugiada no Brasil, ela conquistou um lugar na Equipe Olímpica de Refugiados e recebeu treinamento em uma escola fundada e mantida por Flavio Canto, medalhista olímpico brasileiro no esporte. “Eu vou fazer parte desta equipe de atletas refugiados e vou ganhar uma medalha. Eu sou uma atleta competitiva, e esta é uma oportunidade que pode mudar a minha vida”, disse. “Espero que minha história seja um exemplo para todos, e talvez a minha família me veja e possamos estar juntos novamente”.

Contribuiram para a reportagem Alex Court da Bélgica e de Luxemburgo, Luiz Godinho e Diogo Félix do Brasil, Josie Le Blond da Alemanha e Mike Pflanz do Quênia.

Paulo Amotun Lokoro, 24, Sudão do Sul, 1.500 metros

Há apenas alguns anos, Paulo Amotun Lokoro era um jovem pastor que cuidava das poucas cabeças de gado de sua família nas planícies do que é hoje o Sudão do Sul. Ele diz “não saber nada” do mundo, exceto a sua própria terra natal, que esteve em guerra por quase toda a sua vida. Os efeitos desse conflito empurraram-no para o vizinho Quênia, onde ele desenvolveu novas, grandes ambições: “Eu quero ser campeão mundial”, disse.

Vivendo em um campo de refugiados, Paulo se destacou em esportes da escola e conquistou um lugar no grupo de refugiados que agora treinam perto de Nairobi, sob a orientação de Tegla Loroupe, o famoso corredor queniano que detém vários recordes mundiais. “Antes de vir aqui, eu nem sequer tinha tênis para treinar”, disse. “Agora temos treinado e treinado, até que nós nos vemos em um bom nível, e agora sabemos plenamente como ser atletas”.

“Antes de vir aqui, eu nem tinha tênis para treinar”.

O esforço foi recompensado: Paulo está a caminho do Rio de Janeiro. “Estou muito feliz”, disse. “Eu sei que eu estou correndo em favor dos refugiados. Eu era um daqueles refugiados lá no campo, e agora alcancei um lugar especial. Vou conhecer tantas pessoas. Meu povo vai me ver na televisão, no Facebook”. Ainda assim, o seu objetivo é simples: “ Se eu tiver um bom desempenho, vou usar isso para ajudar a sustentar a minha família e meu povo”.

Yusra Mardini, 18 anos, Síria, 200-metros nado livre

Quando a embarcação começou a encher de água, Yusra Mardini soube o que fazer. Encalhada na costa turca com 20 outros passageiros desesperados, a adolescente de Damasco caiu na água com sua irmã, Sarah, e começou a empurrar o barco em direção à Grécia.

“Algumas pessoas não sabiam nadar”, disse Yusra, que representou a Síria no Campeonato de Natação no Mundial FINA em 2012. “Teria sido vergonhoso se as pessoas em nosso barco tivessem se afogado. Eu não iria ficar sentada e reclamar que eu poderia me afogar”.

Durante esta perigosa travessia, Yusra perdeu seus sapatos – um pequeno preço a pagar para garantir que vidas não fossem perdidas. Depois de chegar à ilha grega de Lesvos, ela viajou para o norte com um grupo de solicitantes de refúgio, sob orientação esporádica de contrabandistas.

“Eu quero mostrar a todo mundo que, depois da dor, depois da tempestade, vem a calmaria”.

Não muito tempo depois de chegar à Alemanha, em setembro de 2015, ela começou a treinar no clube Wasserfreunde Spandau 04, em Berlim. Agora, aos 18 anos, ela está se preparando para competir nos 200 metros nado livre feminino, nos Jogos Olímpicos no Brasil, como parte da Equipe Olímpica de Atletas Refugiados.

“Eu quero representar todos os refugiados para mostrar a todos que, depois da dor, depois da tempestade, vem a calmaria”, disse. “Eu quero inspirá-los a fazer algo bom de suas vidas”.

Yiech Pur Biel, 21 anos, Sudão do Sul, 800 metros

Yiech Pur Biel sabia desde cedo que se quisesse vencer na vida ele teria que fazer por isso por conta própria. Forçado a fugir dos conflitos no Sudão do Sul, em 2005, ele acabou chegando sozinho em um campo de refugiados ao norte do Quênia. Lá, ele começou a jogar futebol, mas ficou frustrado por ter que depender tanto do comprometimento de seus companheiros de time. Acabou escolhendo o atletismo pois sentia que tinha um maior controle sobre seu próprio destino.

“A maioria de nós enfrenta uma série de desafios”, disse Yiech. “No campo de refugiados, não temos instalações ou mesmo calçados. Não há academia. Até mesmo as condições climáticas não favorecem os treinos devido ao calor intenso que faz desde o amanhecer até o anoitecer”.

“Tenho a oportunidade de mostrar aos meus colegas refugiados que eles têm chances e esperança na vida”.

Apesar das adversidades, ele se manteve motivado. “Eu foquei em meu país, o Sudão do Sul, porque somos nós, as pessoas jovens que podem mudar essa realidade”, disse. “E em segundo lugar, eu foquei em meus pais. Eu preciso fazer algo para mudar a situação em que eles vivem”.

Yiech afirmou que competir os 800 metros no Rio poderia ajudá-lo a se tornar um embaixador pelos refugiados de todos os lugares. “Eu posso mostrar aos meus colegas refugiados que eles têm chances e que podem ter esperança. Seja por meio da educação, ou mesmo correndo, podemos mudar o mundo”.

Rose Nathike Lokonyen, 23 anos, Sudão do Sul, 800 metros

Até o ano passado, Rose Nathike Lokonyen mal conhecia o talento que ela tinha. Ela nunca havia competido, mesmo como amador, depois de deixar o Sudão do Sul por causa da guerra, quando ela tinha 10 anos de idade. Então, durante uma competição escolar em um campo de refugiados no norte do Quênia, onde ela vive, um professor sugeriu que ela fizesse uma corrida de 10 km. “Eu não tive nenhum treinamento. Foi a primeira vez que corri e eu cheguei em segundo lugar”, disse sorrindo. “Fiquei muito surpresa!”

Desde então, Rose se mudou para um campo de treinamento perto da capital queniana, Nairobi, onde ela está se preparando para realizar a corrida de 800 metros nos Jogos Olímpicos. “Eu estarei muito feliz e vou trabalhar duro para provar a mim mesma”, disse. Ela vê o atletismo não só como uma avenida para ganhar prêmios em dinheiro e endossos, mas também como uma maneira de inspirar outras pessoas. “Eu serei uma representante do meu povo lá no Rio e talvez, se eu for bem-sucedida, possa voltar e realizar uma corrida para promover a paz e unir as pessoas”.

“Eu serei uma representante do meu povo lá no Rio”.

No entanto, ela ainda está preocupada com as lesões. “Esse é o meu principal desafio”, disse. Até recentemente, ela não estava treinando com um par de tênis profissional, e não teve orientação profissional. Ela ainda parece surpresa que, em pouco mais de um ano, tenha chegado a este ponto. “Eu posso ver a corrida como um esporte ou, como agora vejo, uma carreira”.

Popole Misenga, 24 anos, República Democrática do Congo, judô

Popole Misenga tinha apenas nove anos de idade quando teve que fugir dos combates em Kisingani, na República Democrática do Congo. Separado de sua família, ele foi resgatado depois oito dias na floresta e levado para a capital, Kinshasa.

Lá, em um centro para crianças deslocadas, ele descobriu judô. “Quando você é uma criança, você precisa ter uma família para lhe dar instruções sobre o que fazer, e eu não tinha uma. O judô me propiciou serenidade, disciplina, compromisso – tudo”.

“O judô me propiciou serenidade, disciplina, compromisso”.

Popole se tornou um judoca, mas cada vez que ele deixava de vencer uma competição, seu treinador o trancava em uma jaula durante dias com apenas café e pão para comer. Finalmente, durante o Campeonato Mundial de Judô realizado no Rio em 2013, onde ele foi privado de comida e eliminado na primeira fase, ele decidiu pedir refúgio no Brasil.

“No meu país, eu não tinha um lar, uma família ou crianças. A guerra causou muita morte e confusão, e eu pensei em ficar no Brasil para melhorar a minha vida.”

Depois de ganhar o status de refugiado, Popole começou a treinar numa escola fundada por Flavio Canto, um medalhista olímpico. “Eu quero ser parte da Equipe Olímpica de Atletas Refugiados para me manter sonhando, para dar esperança a todos os refugiados e tirar deles a tristeza”, disse. “Eu quero mostrar que os refugiados podem fazer coisas importantes”. Ele também espera que seus pais possam o ver. “Eu vou ganhar uma medalha, e dedicá-lo a todos refugiados”.

Yonas Kinde, 36 anos, Etiópia, maratona

Em uma colina com vista para a cidade do Luxemburgo, Yonas Kinde desliza sobre a pista de corrida com determinação e graça.

“Eu tenho energia, e mais e mais energia”, diz o maratonista etíope, após um largo sorriso estampar seu rosto. “Eu normalmente treino todos os dias, mas quando ouvi esta notícia (sobre a Equipe Olímpica de Atletas Refugiados), comecei a treinar duas vezes por dia, todos os dias, para estes Jogos Olímpicos. É uma grande motivação”.

Yonas, que vive em Luxemburgo há cinco anos, está sempre em movimento. Ele está tendo aulas de francês regularmente e dirige um táxi para ganhar a vida. Ele se empenha ao máximo para melhorar como corredor. Na Alemanha, em outubro do ano passado, ele terminou uma maratona no impressionante tempo de 2 horas e 17 minutos.

“Nós podemos fazer tudo no campo de refugiados”.

Mas as lembranças de quando fugiu de casa continuam sendo desagradáveis. “É uma situação difícil”, contou sobre sua a vida na Etiópia. “Para mim é impossível viver lá… É muito perigoso para a minha vida”.

Para Yonas, a chance de correr com os melhores do mundo no Rio de Janeiro é muito mais do que outra simples corrida. “Eu acho que vai ser a grande mensagem que refugiados, jovens atletas, podem dar o seu melhor”, disse. “É claro que temos problemas – nós somos refugiados – mas podemos fazer tudo no campo de refugiados, então isso ajudará os refugiados atletas”.

Anjelina Nadai Lohalith, 21 anos, Sudão do Sul, 1.500 metros

Quando Anjelina Nadai Lohalith tinha seis anos de idade, ela foi forçada a fugir de sua casa, no Sudão do Sul. Desde então, ela nunca mais viu ou falou com os seus pais. Quando a guerra chegou à sua aldeia, “tudo foi destruído”, disse. Anjelina ouviu dizer que seus pais ainda estão vivos, embora no ano passado a fome tenha assolado a região. Enquanto ela intensifica seus treinos antes de competir os 1.500 metros no Rio, ajudar os pais é a sua principal motivação.

Quando a guerra chegou à sua aldeia, “tudo foi destruído”

Ela já sabia que era boa no atletismo depois de vencer competições escolares no campo de refugiados onde ela vive, ao norte do Quênia. Mas foi só quando os treinadores profissionais chegaram para selecionar e levar os atletas para um campo de treinamento especial que ela percebeu o quão veloz estava. “Foi uma surpresa”, diz ela.

Agora, no Rio de Janeiro, ela quer correr bem e em seguida conquistar boas posições em corridas internacionais para receber prêmios significativos em dinheiro. “Se você tem dinheiro, sua vida pode mudar”, diz Anjelina. A primeira coisa que ela faria com uma grande vitória? “Construir uma casa melhor para o meu pai”.

James Nyang Chiengjiek, 28 anos, Sudão do Sul, 800 metros

Aos 13 anos, James Nyang Chiengjiek foi forçado a fugir de sua casa em uma região do Sudão (atualmente Sudão do Sul) para evitar ser sequestrado pelos rebeldes que faziam recrutamento forçado de crianças soldados. Vivendo como refugiado no Quênia, país vizinho, ele frequentou a escola em uma cidade serrana famosa por seus corredores e se juntou a um grupo de treinamento de meninos mais velhos para treinar corridas de longa distância. “Foi quando percebi que eu podia ser um velocista – quando Deus lhe dá um talento, você deve colocá-lo em prática”, disse.

No começo, ele não tinha tênis adequados para a corrida. Algumas vezes ele pedia calçados emprestados, mas vencia com qualquer calçado que usava nos pés. “Todos nós temos um monte de lesões por causa dos calçados inadequados que usamos”, disse. “Por isso nós compartilhávamos. Pois se você tivesse dois pares de tênis, podia ajudar a quem não tinha nenhum”.

“Ao correr bem, eu estou fazendo algo bom para ajudar os outros”.

Quando for para o Rio, James pretende servir de inspiração para outras pessoas. “Correndo bem, eu estou fazendo algo bom para ajudar os outros – especialmente os refugiados”, disse. “Talvez entre eles existam outros atletas talentosos, mas que ainda não tiveram uma oportunidade. Nós, refugiados, que estamos tendo a oportunidade de ir para o Rio, temos que olhar para trás e ver onde nossos irmãos e irmãs estão. Assim, se um deles também tiver talento, podemos trazê-los para treinar conosco e tornar suas vidas melhores também”.

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