Chefe do ACNUR pede estratégia comum para resolver crise de refugiados na Europa
(ACNUR, 04/09/2015) O chefe da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR), António Guterres, disse hoje que a União Europeia enfrenta um “momento decisivo” e divulgou um conjunto de diretrizes paras apoiar os esforços voltados para resolver a atual crise de refugiados e migrantes que a Europa enfrenta.
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Guterres ressaltou que as chegadas ao Mediterrâneo e em outros países da União Europeia representam “o maior fluxo de refugiados para a Europa durante décadas”, o que exige um “enorme esforço comum” e o fim da atual abordagem fragmentada que tem levado a Europa a falhar em sua tentativa de encontrar uma resposta eficaz a esta situação.
“A Europa não pode continuar respondendo a esta crise com uma abordagem fragmentada. Nenhum país pode fazer isso sozinho, e nenhum país pode se recusar a participar desta resposta”, disse Guterres em um comunicado divulgado hoje, antes da rodada de reuniões que a União Europeia terá sobre esta crise atual. “Circunstâncias excepcionais requerem resposta excepcionais. Lidar com esta crise da maneira usual não resolverá o problema”, afirmou o chefe do ACNUR.
“Só neste ano, mais de 300 mil pessoas arriscaram suas vidas para cruzar o mar Mediterrâneo. Mais de 2.600 não sobreviveram à perigosa travessia, incluindo um menino de 3 anos de idade, Aylan, cuja foto tem comovido o coração das pessoas ao redor do mundo”, disse Guterres.
Guterres elogiou alguns exemplos de generosidade e de liderança moral “verdadeiramente inspiradores” por parte de alguns países e muitos cidadãos, mas reiterou seu apelo para uma estratégia coletiva, com ênfase na necessidade da solução dos conflitos.
A imagem do jovem menino sírio, cujo corpo foi arrastado até uma praia turca depois de uma tentativa fracassada de alcançar a Grécia, tem comovido milhões de pessoas em todo o mundo e lançado um novo holofote sobre as tragédias humanas que ocorrem agora regularmente no Mediterrâneo.
“Agora, a União Europeia não tem outra escolha a não ser mobilizar o máximo de forças para enfrentar esta crise. A única maneira de resolver este problema é a implementação, por parte da EU e dos seus países membros, de uma estratégia comum baseada em responsabilidade, solidariedade e confiança”, afirmou o Alto Comissário da ONU para Refugiados.
Guterres pediu a todos os países que respeitem as obrigações do direito humanitário internacional e ressaltou que mesmo aqueles que conseguem chegar à costa e às fronteiras da Europa enfrentam perigos terríveis. “Após chegarem à Europa, eles continuam sua jornada enfrentando o caos e indignidades, exploração e perigo nas fronteiras e ao longo do caminho”, adicionou.
O Alto Comissário da ONU para Refugiados apontou seis princípios fundamentais que, segundo ele, deve guiar os esforços para resolver a atual crise de refugiados no continente europeu:
1) Esta é uma crise principalmente refugiados, não somente um fenômeno de migrações. A vasta maioria daqueles que chegam à Grécia vem de zonas de conflito, de países como a Síria, Iraque ou Afeganistão e estão simplesmente lutando por suas vidas. Todas as pessoas que estão se locomovendo nestas circunstancias trágicas merecem ter seus direitos humanos e sua dignidade inteiramente respeitados, independentemente de seus status jurídico. Mas nós não podemos esquecer a responsabilidade particular que todos os países têm frente aos refugiados, de acordo com o direito internacional.
2) A Europa não pode continuar a responder esta crise com uma abordagem fragmentada. Nenhum país pode fazer isso sozinho, e nenhum país pode recusar a fazer a sua parte. Não é nenhuma surpresa que quando um sistema não é balanceado e funcional, tudo fica bloqueado quando a pressão aumenta. Este é um momento decisivo para a União Europeia, que agora não tem outra escolha a não ser mobilizar forças para solucionar esta crise. A única maneira de resolver este problema seria União Europeia e todos os seus países membros implantarem uma estratégia comum, baseada em responsabilidade, solidariedade e confiança.
3) Concretamente, isso significa tomar medidas urgentes e corajosas para estabilizar a situação e, em seguida, encontrar uma maneira de verdadeiramente compartilhar a responsabilidade no médio e longo prazos. A UE deve estar pronta, com a permissão e em apoio aos governos mais afetados – principalmente a Grécia, a Hungria e a Itália – para implementar um acolhimento de emergência adequado, com assistência e capacidade para registrar estas pessoas. A Comissão Europeia deve mobilizar as agências e mecanismos de asilo, migração e de proteção civil da União Europeia para este propósito, incluindo seus recursos financeiros e com o apoio do ACNUR, da Organização Internacional de Migrações e da sociedade civil. Do nosso lado, o ACNUR está totalmente empenhado em intensificar seus esforços. É essencial que as famílias de refugiados que desembarcam na Europa, depois de ter perdido tudo, sejam bem-vindas em um ambiente seguro e acolhedor.
4) Pessoas que tenham uma solicitação de refugio válida, nesta triagem inicial, devem ser beneficiadas por um massivo programa de realocação, com a participação obrigatória de todos os Estados membros da UE. Uma estimativa preliminar indica a necessidade de realocar até 200 mil pessoas. Isso só poderá funcionar se for adotado em conjunto com um sistema de acolhimento adequado, especialmente na Grécia. A solidariedade não pode ser responsabilidade de apenas alguns dos países membros da UE.
5) Aqueles que não precisam de proteção internacional e que não podem se beneficiar de oportunidades de migração legal devem ser ajudados a voltar rapidamente para seus países de origem, com o total respeito de seus direitos humanos.
6) Os únicos que se beneficiam com a falta de uma resposta comum da União Europeia são os contrabandistas e traficantes que estão lucrando com o desespero das pessoas em busca de segurança. É necessária uma cooperação internacional mais efetiva para reprimir os contrabandistas, incluindo aqueles operando dentro da União Europeia, mas de maneira que permita a proteção das vitimas. Mas nenhum desses esforços será efetivo sem que sejam abertas mais oportunidades para pessoas virem legalmente para a Europa e encontrar segurança em sua chegada. Milhares de pais refugiados estão arriscando as vidas de seus filhos em embarcações inseguras de contrabandistas e traficantes principalmente porque não têm outra escolha. Países europeus e governantes em outras regiões devem expandir o reassentamento e aumentar quotas de admissão humanitárias, implantar programas de vistos, de bolsas de estudo e outras formas que permitam uma entrada legal na Europa. A reunião familiar deve tornar-se uma realidade e uma opção acessível para muito mais pessoas do que é atualmente. Se estes mecanismos forem expandidos e feitos de maneira mais eficiente, nós podemos reduzir o número de pessoa que são forçadas a arriscar suas vidas no mar.
Para o chefe do ACNUR, esta situação exigirá uma séria reflexão sobre o futuro, pois tal fluxo massivo de pessoas não irá parar até que as causas do deslocamento sejam abordadas. Muito mais deve ser feito para prevenir conflitos e parar as guerras em curso que estão afastando tantas pessoas de suas casas. Os países vizinhos a zonas de guerra, que abrigam 90% dos refugiados ao redor do mundo, devem ser apoiados fortemente, inclusive financeiramente. Ao mesmo tempo, é também essencial que as políticas de cooperação para o desenvolvimento sejam reorientadas com o objetivo de dar às pessoas a oportunidade de ter um futuro em seus próprios países.
“A Europa enfrenta seu momento da verdade. Chegou a hora de reafirmar os valores sobre os quais foi construída”, afirmou Guterres.
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